
Pensava na teatralidade da vida. Quem dirigia? Quem escolhia o elenco? Quem determinava aquele que faria o papel principal? Quem executava os cenários? E os diálogos e enredos, quem os escrevia? O público, de onde vinha? Era convidado ou pagava pelo ingresso?
De um fato estava certa: seu papel neste espetáculo não se ajustava ao seu talento, assim como as pessoas sem talento obtinham papéis de destaque.
Pensava, pensava... Suas falas- sabia de tudo que trazia guardado dentro de si- eram aquém do que sentia e podia. Os aplausos nunca lhe eram dirigidos.
Quem sabe, não, com certeza não se permitira libertar a voz e o sentimento que borbulhavam dentro dela. Juntou-se, ou a juntaram à companhia e ao diretor errados que não souberam fazê-la "soltar" o que sentia e sabia.
A ela e somente a ela cabia a responsabilidade dos escassos aplausos e do pouco reconhecimento da crítica e platéia.
Conformara-se com qualquer enredo, sem sair em busca do texto, que lhe tocando a alma faria seu talento inteiro aparecer e os aplausos explodirem.
O teatro da vida...
Há que se ter pressa pois as temporadas se esgotam e passando-se pelo tempo já não existirá peça em que se possa atuar.
Ninguém dirige o teatro da vida, ninguém escolhe atores ou autores.
Descobriu que ela mesma é que escolhera com quem, o que e onde iria representar. Bastaria ter usado bem o seu talento e buscado o seu sucesso sem se importar se iria deixar abertos espaços nas peças que outros montaram para eles mesmos e a colocaram como coadjuvante.
Ao apagar das luzes da vida percebeu, afinal, que neste teatro há que se ser o ator principal, pois o resto é figuração!
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Sonia Regina / 2000