
Nada que tivesse acontecido de um dia para outro, nada que a tivesse apanhado de surpresa... Não... Foi chegando devagar, muito devagar, ano após ano, gota após gota, como aquelas que desgastam fantasticamente cavernas sólidas, milenares e traçam nelas seu desenhos caprichosos, indeléveis. As gotinhas são frágeis,quase invisíveis, mas que força de transformação possuem!!!
Foi assim que aconteceu...Dia a dia, instante a instante, as gotinhas do nada foram abalando sem pedir licença os alicerces em que se apoiava a construção da sua vida.
Por muito, muito tempo sequer se apercebeu e continuou a caminhar procurando convencer-se de que tudo era passageiro e que seu caminho, o que fora traçado para caminhar, logo, logo surgiria e tudo o mais ficaria para trás.
Com essa confiança, havia risos, havia festas e muitos momentos de alegria.
Mas, a coisa estava lá, sempre esteve: quieta, ciente de sua força paciente, ciente das metas que desejava atingir.
Primeiro foi o aprender a digerir traições: sujas,sem critérios nem razões...O respeito por seus sentimentos rolou pela poeira de aberrações que a faziam odiar ser mulher.
Matou a mulher e restaram os sonhos tolos e infantis que alimentavam seu imaginário e "morfinavam" sua dor e vergonha.
O tempo passando, o veneno ali matando e ela brincando de sorrir. Resolveu tentar ser boa, ser amiga para tentar comprar a simpatia dos que a rodeavam.
Por anos teve a sensação de haver conseguido. Defendia, sofregamente, pessoas que todos detestavam, e ela as compreendia, agradava e sorria. E...essas pessoas a ridicularizaram.
Os bens materiais, poucos, foram escapando por entre os seus dedos, outros lhe foram arrancados das mãos sutilmente ou por franquia e fraqueza de uma porta aberta por onde ela saiu para jamais voltar.
A coisa a tomou para si...
***
Sonia Regina/1994