
Eu inventei uma categoria. Chama-se:"as pessoas". Não está nos manuais de sociologia, nem nos livros de Freud. Não pertence a classes sociais, não excita ideólogos. As pessoas.
Não são a massa, tampouco o indivíduo. Não são turba, multidão, ajuntamento ou turma. As "pessoas" não se definem.
Elas estão entre os que sonham e não conseguem. São burras, feias, lindas ou inteligentes. As"pessoas" são o tempo passando em forma de gente. São os séculos desfilando em forma de vidas.
As pessoas estão na multidão, mas não são a multidão. Estão nos auditórios,salões da sociedade ou nos quadros dos pintores.
As pessoas consomem sem teorizar, amam sem saber, vivem sem cogitar. As pessoas respondem ao que lhes fala ao sentimento, dizem bobagens, grandezas, lêem subliteratura, lêem Proust, Drummond ou Rubem Fonseca, adoram Fernando Pessoa ou Brahms.
As pessoas não pensam, são. Não vivem, duram. Não falam, reagem. Não buscam, têm. Não sabem, agem. As pessoas são aquelas que nas fotos ninguém sabe quem são.
As pessoas estão. Ali, aqui, eu, tu, ele, nós, vós, eles.
Amar as pessoas em suas rugas e sonhos. Sentir o espasmo absurdo e maravilhoso de seu sentimento. Beber sua alienação. Entender sua grandeza.
São as pessoas, as que estão aí, vendo caladas e sonhando, sonhando, sonhando sempre e vendo caladas o tempo implacável passar sobre elas. São elas as que nos devolvem à média melancólica do que somos sem os vernizes de tanta coisa.
As pessoas estão aí: comendo, envelhecendo, amando, durando, indo ao psicanalista,entupindo-se de teorias e pastéis, curtindo shows, modas e circunstâncias, vivendo aqui e alhures, pagando aluguéis e rindo de piadas, crescendo as bochechas e tentando biografias, dando razão a educadores ou comprando CDs, batendo nos filhos e comendo sanduíches,passando, passando.
As pessoas não têm rosto. Rosto é ampulheta: implacável e indiferente.
Artur da Távola, postado por Sonia Regina.
8 comentários:
Seu poema nos leva pensar com serenidade sobre as pesoas que nos rodeiam. "As "pessoas" são o tempo passando em forma de gente.São os séculos desfilando em forma de vidas".
Lindo!!! Sonia.
Um abraço amiga.
As pessoas são realmente misteriosas.
Bom dia amiga.
Obrigada pelas visitas.
beijooo.
Gostei de «As pessoas, esse mistério», tanto no aspecto da sua (in)classificação como no da extensa enumeração de casos em que (não)actuam, em que quase só são pessoas, gente, que está, que é, presencialmente como que abstracta, que se deixa ir, que faz ou age sem sobressair, ou até sem se notar, gente apenas estatística... Concordo com a expressividade da postagem, com o seu conteúdo alertante, concordo que há essa humana indiferença de gente, pessoas, que a Humanidade comporta e que não consegue elevar de valor, de mérito, para que a Humanidade fosse mais sublime, mais igual, mais e melhor interactuante... E as ciências humanas, ou sociais, pouco, através dos anos, têm conseguido fazer para desmisteriorizar essas estranhas e apáticas pessoas.
Apetece, para acordar essa eterna estagnação, qual pedrada num charco humano, gritar, gritar, justificando a adequação do nome do blogue: «...eu vou gritar pra todo mundo ouvir...»
Oi,Angela!O tempo passa sobre as pessoas e a maioria nem as percebe...
Obrigada pela presença constante,beijos,Sonia Regina.
Olá Ana!Os anônimos são a verdade da vida...
Tenha uma boa noite,beijos,Sonia Regina.
Olá querida Sónia,
Muito interessante, amiga, o que hoje nos oferece neste post.
Faz-nos reflectir e pensar...
Um abraço, amiga linda
Viviana
Olá amigo!Muito bom o seu comentário,você é brilhante!!!Escutou todos os gritos,os meus e os das "pessoas".
Deveria ter um blog que,com certeza,faria sucesso...
Brilhante como você só conheço mais uma pessoa e é uma pena gostaria de conhecer um só pois assim saberia quem é,rsrsrs...
Gostei muito de sua análise e de que tenha apreciado o post,um
abraço,Sonia Regina.
Obrigada pela visita,Viviana!É necessário estar atento para que as "pessoas" não passem incógnitas por nós,beijos carinhosos,Sonia Regina.
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